quinta-feira, 8 de outubro de 2009
O mal é o desejo
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
This is going to be the happiest day of my life
Escuto isso, quase todos os dias, de Michael Scott. E cada dia eu alimento a certeza que o The Office é o melhor seriado de tv. Seu humor não é feito de palavrões, apelação, mulheres seminuas, caricaturas escrachadas. Mas de pessoas comuns, que tem um realismo incrível pra deixar os espectadores espantados com os absurdos da vida normal. Diria que o espírito geral que permeia The Office é bem triste e desesperador mesmo, mas a agilidade dos esquetes e das ações, entremeados pelos depoimentos no estilo mais que atual de reality show, dão o equilíbrio e a graça pra esse todo meio irônico, meio amargo. Cada personagem não é um estereótipo, mas um clássico; na minha opinião, criados no método de fazer uma personalidade dentro de um corpo estranho a ela, o que torna tudo engraçado e especial. Kelly Kapoor é a típica bitch dos dias de hoje, toda segura e arrogante, mas indiana, fora dos padrões estéticos. Dwight Schrute seria o típico homem das cavernas, com a mente de quem mata pra sobreviver, mas engravatado dentro do escritório. Michael Scott é o típico idiota, que ninguém gosta de ter por perto e que nunca é responsável, contudo, é o patrão. Dessas deliciosas contradições saem coisas absurdas, como “Beers in heaven”, ou uma exposição pública dos relacionamentos amorosos de cada empregado como forma de apresentá-los, ou Michael embebedando Meredith pra obrigá-la a ir a uma clínica de reabilitação, ou uma sala de escritório transformada em discoteca em pleno horário de expediente, com o chefe insistindo pra que todos vão dançar. Maravilhosa também é profunda zombaria que a série faz com a divinização das grandes corporações, do espírito de liderança e equipe, da produtividade – são todas besteiras reais que temos que ouvir e nos sentir culpados por não vivê-las, mas que, na verdade, não existem! Ainda bem.
Dwight merecia um texto imenso só sobre ele. Um selvagem, completamente sem coração, descendente e falante de alemão (a língua mais deliciosamente bárbara entre as modernas), mente de fazendeiro, mente de predador. Só assim mesmo pra ele ser o ás da produtividade.
Enfim, The Office, meu grande amor de 2009.
quinta-feira, 9 de julho de 2009
Um pouco sobre tudo o que um brasileiro pode ser, se ouvir sua loucura
A começar por me apresentar uma parte da cultura brasileira da qual eu não sabia que era tão ignorante: a tropicália. Cresci ouvindo Caetano Veloso, li algumas de suas incursões literárias, sempre achei ele e Gil mais poetas do que músicos - o que me fez perder o interesse pelo movimento em face da musicalidade melhor casada com as letras do Clube da Esquina. Mas ver o nascimento d'Os Mutantes, a importância e influência deles em cantores que sempre gostei (como o Beck Hansen, que fez um cd inspirado por eles, "Mutations"; ou a primeira Marisa Monte, Pato Fu), me fez ver que eu já apreciava o trabalho de forma indireta.
Interessante também rever de perto a estética visual da banda, sem igual até hoje - principalmente nesses nossos tempos pobres de aparência vindo antes da música.
A geração d'Os Mutantes muito saudavelmente não ouvia os adultos, os inimigos da época eram conhecidos – e me lembrei de nós, que seguimos tentando dar alguma forma aos nossos próprios inimigos, mas sempre parando no meio do caminho, se entretendo pelo confortável mundo que nossos pais nos deram, conforto que nos prende, silenciosamente, na inação. Toda nossa geração é imensamente conservadora diante de Arnaldo Baptista, que fez do "distraídos venceremos" uma filosofia real para a vida, baseada nessas idéias hoje fora de moda como alegria, inocência, ironia (em formas mais sinceras).
O peso que eu não esperava carregar nessa tarde vadia de férias era a reflexão sobre as relações entre as pessoas. Arnaldo Baptista se transformando do jovem feliz no adulto, expondo os traumas dessa mudança, tão comum e ruim a todos. Perder o primeiro amor, usar drogas, ser um estranho para o próprio irmão, ser incompreendido pelo movimento que criou, e ver os beneficiados de sua criação o abandonando quando, aparentemente, a "fonte" havia secado - tudo isso criando um abismo misterioso e inevitável para ele mesmo. Achei tocante ver Sérgio Dias falando da sua intransigência da juventude, a obsessão que o jovem tem por suas idéias, passando por cima das pessoas, sem nenhuma flexibilidade pra entendê-las - tal atitude foi um dos motivos, segundo ele, para também se opor ao irmão. Apesar de um certo tom demagógico, (afinal se trata do, oh, virtuose Sérgio Dias, que pela sua declarações na tv, sempre achei que fosse o líder d'Os Mutantes) foi uma fala muito bem encaixada no contexto, figurou claramente na minha cabeça como a minha própria intransigência diante do que não se pode compreender e, enfim, não esperava isso.
O documentário segue o movimento de ascensão do mito Arnaldo Baptista, seu momento de "queda" e reascensão, procurando humanizar o "gênio". Esta intenção é bem trabalhada no vídeo, mas chega até o limite: "fiquei com ele porque não tinha mais ninguém, sobrou pra mim", diz a esposa atual de Arnaldo – depois desta fala, já não é possível não ver o protagonista como um pobre coitado, revestindo nosso olhar (que fora tão bem conduzido ao longo do filme), agora, de uma pequena dose de triste pieguice.
Outra reflexão importante que se faz presente é a precariedade no trato com arte e artistas no Brasil, atitude cuja conseqüência é a pobreza cultural cotidiana das massas no país (e me incluo nela, já que eu não sabia nada mesmo sobre Os Mutantes). Isso faz com que figuras importantes como Arnaldo Baptista só se tornem melhor reconhecidas no exterior, e aqui, sejam engolidas por julgamentos sobre sua vida pessoal – esquece-se de toda a arte, que distingue tão bem o protagonista de um simples louco.
Mas, enfim, assistam, é um capítulo importante da história de todos nós, não se identificar um pouco que seja com as canções, os atos, as histórias, as relações, as roupas, as idéias é quase impossível.
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
Must be talking to an angel
Enfim, vê-la no show, tão de perto, foi a impressão de rever uma velha amiga, com quem nunca se conversou. Ela também é tão baixinha, visível no pedestal do microfone, levantado antes e já emoldurando a sua presença. Como ela fala durante o show! Às vezes é chato e desnecessário, mas em muitas outras é engraçado e reforça a sensação de velha amiga, quebra a imagem de fofinha e tímida, que é um tanto enjoativa por mais de meia hora. Bem engraçada mesmo, no caminho do espirituoso – essa bendita palavra que eu gosto mas nunca entendo completamente o que seja.
“Nunca subestime uma mulherzinha” é a lição a se tirar, Takai e Nelson Motta criando a surpresa de fazer os fãs antigos de Nara Leão consumirem a novidade da sua interpretação em “Onde brilhem os olhos seus”, e ao mesmo tempo levar a geração de Pato fu (como eu) a se reconhecerem na cantora carioca. As canções revivendo os anos 80 foram as melhores, com o violão do John me lembrando o “Love Vigilants” do show do Pato fu em Belo Horizonte, acho que em 2000, época do “Televisão de cachorro”, melhor fase da banda. “There must be an angel” foi uma surpresa feliz pra mim, que conhecia a música das minhas tardes chatas de tarefa e Jovem Pan, e ouvindo agora novamente na versão original do Eurythms quase morri com as firulas tristes da cantora e aquela bateria podre de anos 80. “An angel playing with my heart” foi o que Fernanda conseguiu ser ali, divertindo, cutucando, rindo, cantando Duran Duran em sua própria homenagem pra homenagear nossa lembrança de fazer o próprio caminho pelo mundo ordinário.
Não gostei daquele pessoal tentando tirar fotos de jornalista, atirando no show com máquinas, pra divulgar a imagem de uma cantora que a cidade mal conhece – todo mundo que a conhecia devia já estar por lá mesmo.
Pessoalmente, fiquei chateada com os rumos que o Pato fu foi tomando, o rock de John já não é a personalidade da banda, mas sim o pop de Fernanda, desde “Isopor”. E o que eu vi ontem me mostrou como eu subestimei a mulherzinha, que já não é mais tão tímida e infantil assim, sabe bem rir de si mesma, algo que definitivamente eu precisaria aprender com alguma urgência.
quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009
Match Point e o problema das referências
Foi muito interessante ver as misérias humanas e o fracasso sendo tema da interpretação desses dois modelos de perfeição física de Hollywood, tal sofrimento salvou um pouco a personagem de Scarlett Johansson, afinal, ser atriz e interpretar uma não é exatamente encarnar um novo papel – o que, guardadas as proporções, “quase” me lembra a Beyonce, que fez vários filmes, sempre no papel de cantora, lhe poupando o esforço de atriz.
Enfim, por que Crime e Castigo? O desejo irresistível de ser poderoso e ter o aval “divino” para matar é bem doentio e cartártico – a força que há em ser Napoleão foi a coisa que mais me identificou com Raskolnikov quando fiz minha primeira leiturinha. Só isso é o suficiente? A referência teve a virtude de aparecer direta, não através de citações pedantes, mas na releitura das ações: o latrocínio, a culpa (a cena do sonho de Chris teve os melhores diálogos do filme), a conversa torturante com o detetive (que infelizmente durou tão pouco).